14 abril 2010

Duas Guerras, Duas Diplomacias

Primeira Guerra Mundial

João chagas escreveu um dia que o inimigo que Portugal tinha no conflito europeu era a Inglaterra. Nada podia ser mais exacto. Chagas e alguns outros, entre os quais se inclui o Coronel Freire de Andrade, ministro dos Negócios Estrangeiros em 1914, queriam ver a República a combater na frente ocidental, com a França e a Inglaterra. Havia no entanto um obstáculo no caminho da intervenção portuguesa: a própria Inglaterra.

A posição oficial Portuguesa foi a de, estando em paz com todas as potências, estar também pronto a corresponder incondicionalmente aos seus «deveres» para com a Inglaterra. Á primeira leitura desta declaração de amizade - que em França, por exemplo, se interpretou como um acto de hostilidade á Alemanha - , os ingleses ficaram irritados.
A ideia de terem Portugal a combater do seu lado causava-lhes uma repugnância absoluta. A diplomacia Inglesa chegava mesmo a pensar que tinha que suportar as despesas de intervenção Portuguesa vistas as dificuldades da pequena República. Desagradava-lhe ainda ficar limitada com compromissos com Portugal em eventuais negociações de paz.

Churchill aliás achava mesmo que se deveria preferir a aliança de Espanha, e até mesmo facilitar a anexação de Portugal, se fosse essa a condição para ter os Espanhóis do lado Inglês. Mas...

Por detrás do menosprezo estava uma realista avaliação estratégica de Portugal: a única coisa importante para a Inglaterra era que Portugal só tinha valor estratégico para a Alemanha, caso esta pudesse estabelecer uma esquadra no Tejo. Por isso o único interesse que a Inglaterra tinha em relação a Portugal era mante-lo neutral.

No entanto, em Setembro de 1914, o desgaste dos Aliados levou o comando Francês a interessar-se pelo que Portugal pudesse oferecer em Artilharia e Infantaria.

Foi assim que Grey, sem qualquer entusiasmo, convidou o Governo Português, a 10 de Outubro, a juntar-se aos aliados. Em Fevereiro de 1916, Costa conseguiu finalmente amarcar á Inglaterra uma "nota verbal" em que se reestabelecia o convite de 10 de Outubro de 1914. As causas foi a ânsia inglesa de se apoderar dos barcos alemães refugiados em portos Portugueses e o direito de Portugal (ao combater activamente no Conflito) participar na futura Conferência de Paz que regularia a organização da sociedade europeia e mundial no Pós-Guerra.

Segunda Guerra Mundial

Imediatamente após o ataque Alemão á Polónia, um Portugal mais "organizado" e mais "ciente" define a sua politica de Neutralidade numa nota oficiosa a 1 de Setembro de 1939.

Então as diferenças das duas guerras assentavam em:
- Uma declaração «unilateral« de neutralidade, isto é, uma tomada de posição da iniciativa de Lisboa, ainda que com consulta ao Foreign Office, mas não por sugestão deste ou em resposta a um pedido nesse sentido de um Governo sem saber que atitude adoptar, como acontecera com o Ministério de Bernardino Machado, em Agosto de 1914.
- Uma declaração de neutralidade e não de «não beligerência», como também sucedera com o Governo Português na I Guerra. Ou seja um posicionamento de maior distância e autonomia relativamente á Grã-Bretanha. Mas, sobretudo no plano da guerra económica, sobejaria a margem da ambiguidade suficiente para o Governo Português - para desespero do Ministry f Economic Warfare Britânico - entender tal neutralidade de forma geométrica ou mais colaborante, ao sabor das conjunturas do momento, e, sobretudo, dos fabulosos negócios em perspectiva com ambos os campos beligerentes,

As caracteristicas e funções da neutralidade portuguesa, aliadas ao facto de, após a queda da França, em Junho de 1940, Portugal se transformar no porto pacífico de entrada e saída da Europa ocupada e em guerra, e a excepcional valorização estratégica das ilhas atlânticas (especialmente os Açores), conferiram ao Governo de Lisboa um papel e uma proeminência internacionais sem precedentes na história do País.

Em suma ganha-mos muito mais na Segunda que na Primeira e Salazar (inteligente) soube tirar, e muito bem os dividendos políticos internos desse período áureo, tendo a posição evoluído ao sabor das diversas conjunturas e fases da guerra e sob a pressão dos interesses contraditórios dos beligerentes.

Imagens: 1ª - Pintura de Sousa Lopes na Sala da Grande Guerra no Museu Militar
2ª - Cartoon - Portugal vende Volfrâmio á Alemanha

Fontes:
História de Portugal, 6º Volume, A Segunda Fundação, Circulo de Leitores
História de Portugal, 7º Volume, O Estado Novo, Circulo de Leitores
Portugal na Conferência da Paz, Paris 1919, José Medeiros Ferreira


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